Por Walmir Rosário
A Cachaça é uma das melhores bebidas do mundo. Se bebida no pé do balcão e com um bom papo, se supera, fica divina. Aqui pra nós, que bebida no mundo tem tantas variedades e podem ser degustadas ao modo do cliente. Cada bebedor tem sua mania e uns que preferem sua caninha gelada, vinda do congelador, licorosa. Outros, à moda da casa, de acordo com a temperatura ambiente. Quente ou fria pouco importa, o que importa, sim, é o efeito.
Bebida de um gole só, a chamada talagada, pra queimar o peito, fazer efeito imediato, um excelente encorajador para tomar banho frio, embora alguns nem consigam tomar banho quando se excedem na dose, que pode ser medida de todos os jeitos. Os prometidos dois dedinhos depende, se na horizontal ou no modo vertical, quem decide é o freguês. Alguns nem sabem o porquê, mas preferem passar a régua como se fosse cobrada em centímetros, o quem sabe metro.
Bom mesmo é bebericar, sem pressa ou agonia, nem mesmo quando a cachaça não é de melhor valia. Se boa não queima a goela por ter sido alambicada no ponto, com fogo regulado e bom aproveitamento. Ah! Essa desce que é uma beleza, dá até pra inventar conhecimento, se é envelhecida em barris de carvalho ou madeira que o valha, bálsamo, jequitibá, amendoim ou amburana para dar um sabor nacional. Coisa de cachaceiro, ou pra ser politicamente correto, cachaçólogo, sommelier. Coisa de gente fina.
Cachaça é bebida pra macho, acreditam alguns, embora digam que depois de umas duas tem gente que amofina, acredito eu por ser fraco do organismo, coisa de fracote, melhor seria se ater aos soft drinks. Aos aguardantes deixem para gente mais acostumada, os que pedem a que matou o guarda, os que não se importam da mistura, se amargas como milome, carqueja, pra curar o fígado, cataia e jambu pra anestesiar. Mas cabra macho mesmo pede é com cobras e escorpiões, e pra fechar o corpo guiné arruda e maconha.
E a Bahia é pródiga em cachaça. Não sei se é bondade da terra ou do solo, mas plantando, colhendo, moendo e alambicando dá cachaça. Da boa é pouco, mas há quem diga que se produz também a incha pé e fofa toba, credo em cruz nem passo perto. Do norte ao sul, do leste ao oeste é alambique pra todo o lado, uns mais famosos como aqueles de Abaíra, Itarantim, destiladas de primeira, sem esquecer a Sedutora de Coaraci e a Índia de Itapitanga, que sumiram por uns tempos e voltaram.
Serra das Almas, da branca e da amarela, feitas em Rio de Contas, Francezinha (sic), embora mineira produzida pelos Carletto, Itagibá, da reserva especial de Emílio, o da Odebrecht, ou menos conhecidas como a Rio de Engenho, mas de qualidade superior, fabricada na vizinha Ilhéus e Vale Verde, em Porto Seguro. Fora da high society somos pródigos em alambique, espalhados pela Bahia afora, engarrafando a branquinha para nosso deleite.
Nem parece que moramos na região cacaueira e basta chegar numa clareira para encontrar plantações de canas aos montes. Pertinho da gente tem pinga, marvada, ca(n)jibrina sendo destilada sem dó nem piedade. Ibicaraí, Itajuípe, Ibirataia, Floresta Azul, Almadina, sem falar em Iguaí e Ibicuí, todas dignas de um gole, desde que se cheire e sinta o perfume da cana. Esqueça as continhas que formam ao balançar o litro, que não é garantia de qualidade e se faz até com água sanitária.
Ao beber se queimar a garganta não insista, tem água fraca, sinal de ganância do fabricante, que não despreza a cabeça, álcool puro, muito menos o final, de gosto ruim, o que é sinal de que não merece sua confiança nem fidelidade. Lembre-se, bebida é pra horas de lazer, pois o Brasil não é a Rússia em que se bebe pra aquecer. Aqui, apesar de quente a cachaça não serve pra esfriar, tudo isso é mania de quem quer se embebedar e tem vergonha de anunciar.
Se a boa cachaça tem lá suas serventias, imaginem o dono de bar. Na high society conhecido como personal boteco, é o especialista na compra da boa cachaça para agradar e fidelizar seus clientes. Nunca cisme com ele e demonstre sua amizade para que sempre lhe sirva da melhor cachaça, sempre à disposição e servida assim que adentra o bar. O que mais impressiona os amigos do que ao chegar no seu boteco ser servido com a cachaça de sua preferência junto aos cumprimentos de praxe? Não é pra todo o mundo.
Eu tenho os meus onde quer chego, com direito a esses mimos, do contrário vou em busca de outra freguesia. Pé sujo, pé de balcão, espaço apertado, não importa, o bom mesmo são os frequentadores, mesmo que o proprietário tenha a sutileza de um elefante numa loja de cristais. Não é mais do que um recurso de marketing para se tornar famoso entre os biriteiros que pensam que gozarão da cara do dono do botequim, apenas faça de conta que você é um cachacista sossegado.
Nada melhor do que um bom conselho para tomar cachaça em botequim, o espaço mais democrático desse Brasil brasileiro, onde se discute desde parto de pulga a conserto dos computadores da Nasa. Procure falar baixo até o segundo gole, se elevar a voz não se exceda, lembre-se que o debate pode ser feito intra e entre mesas sem grandes discussões, mas se discutir não brigue e se brigar assuma que foi coisa de cachaça e imediatamente faça as pazes.
Você será bem chegado em todos os botecos e beberá o resto da vida.
Walmir Rosário é radialista, jornalista e advogado