Iasmin Nascimento é divertida, comunicativa e traz consigo um sorriso estampado no rosto. É assim toda vez que algum colega do Hospital Materno Infantil Dr. Joaquim Sampaio, em Ilhéus, lhe pede auxílio no departamento de Tecnologia e Informática da instituição. Iasmin só muda de fato quando é para falar da sua própria história. As frases passam a soar pausadamente. O sorriso cede lugar a um semblante mais reflexivo. Aos 23 anos, ela sabe a importância dos passos que deu até aqui. E quantos ainda vai precisar para chegar ao seu grande objetivo: concluir o curso superior de Psicologia. Filha de um servidor público que só conseguiu chegar ao ensino médio e de uma trabalhadora doméstica que parou na oitava série do curso ginasial, Iasmin será a primeira de duas gerações da família da mãe a ter um curso universitário. “Trago comigo o significado de ser uma referência. São mais de 30 pessoas da minha família que sonhavam com a mesma oportunidade e não puderam chegar lá”, explica.

Para chegar a esta condição, cada pequeno passo de Iasmin – como ela costuma definir o ritmo da sua trajetória – ganhou ainda mais força no curso técnico em Manutenção e Suporte de Informática, entre 2015 e 2018. Logo que concluiu, soube da existência do Programa Primeiro Emprego (PPE), do Governo da Bahia. Foi contratada pela Fundação Estatal Saúde da Família (FESF SUS), uma das maiores parceiras do estado neste programa social. Atuou no Núcleo Regional de Saúde (NRS) Territorial Sul e no Serviço de Atendimento ao Cidadão (SAC). “Esse sim foi meu primeiro passo”, lembra. Foi a partir do desempenho no PPE que terminou efetivada no quadro de colaboradores da FESF. “Agora já começo a pensar na possibilidade de me especializar em Psicologia Hospitalar. Trabalhando no hospital vi abrir este horizonte”, projeta.

Iasmin assegura que a mudança de trabalhadora educanda PPE para a efetivação na FESF foi o maior desafio da sua vida. Achava que no primeiro dia de trabalho iria decepcionar. “Estava nervosa. Mas quando comecei a colocar meu conhecimento em prática nem eu mesma acreditava que estava dando conta”, lembra. O acolhimento dos colegas e da direção da FESF foi, segundo Iasmin, um ponto fundamental para o sucesso da empreitada. “A FESF me abraçou e fez mais por mim do que eu esperava. As pessoas paravam para saber o que eu pensava”. Iasmin reforça uma significativa estatística do Programa Primeiro Emprego na Bahia. Dos 1.352 trabalhadores ativos no programa na FESF, 81,4% são mulheres e 88,7%, negras.

Experiência

A gestora do PPE na FESF, Luzia Vilma Delgado, destaca que a primeira experiência profissional nas unidades da rede estadual de saúde através do PPE teve início em dezembro de 2016. Já foram contratados pela FESF 3.502 egressos da rede Estadual de Ensino Técnico, distribuídos em mais de 120 unidades de saúde na capital e interior. No total, são 36 municípios, contemplando 26 dos 27 Territórios de Identidade baianos. Uma das metas do PPE é o Programa de Aperfeiçoamento Profissional da FESF-SUS, atividade de Formação Continuada, fundamentada em metodologias ativas de ensino-aprendizagem, ofertando aos TEs um conjunto de cursos de aperfeiçoamento num programa de formação de 300 horas em educação à distância; acompanhamento e monitoramento das atividades desenvolvidas no ambiente laboral; elaboração dirigida de projetos de melhorias a partir da análise de processos de trabalho na prestação do serviço público; e análise das competências do trabalhador a partir da prática laboral para retroalimentação dos currículos no ensino técnico da rede pública estadual.

Oportunidade

Era a oportunidade que Levi da Cruz Firmino, de Salvador, também precisava. E esperava. Levi sempre foi um jovem empreendedor. Sabia que só com muito trabalho poderia vencer na vida. De família humilde, nascido na periferia de Salvador, só conseguiu estudar em uma escola particular aos 11 anos, por conta de uma bolsa que conquistou com as boas notas registradas no boletim. Mesmo assim, a família ainda tinha que arcar com 80 reais da mensalidade. Teve mês que, por falta do recurso, consertou computadores da própria escola, trocando o serviço pelo custo da mensalidade. “Era difícil. Via colegas com muito mais poder aquisitivo, que tinham celulares, coisas boas. Olhei e disse: sou pobre, tenho que estudar pra poder ter minhas coisas”.

Esforço

O pai de Levi saiu de casa quando ele tinha 16 anos. A mãe largou os estudos para prover a casa. “Cheguei a desenvolver uma hepatite autoimune com fibrose tipo 3 no fígado, isso sem beber e sem usar drogas. Desenvolvi uma cirrose”, credita à passagem dos tempos difíceis. Levi viu, de fato, a transformação começar quando fez o médio técnico em Informática no Colégio Estadual Presidente Costa e Silva, na Ribeira. Chegou a estagiar no colégio, onde criou um programa de estágio para os alunos que não conseguiam vagas no mercado externo. “Fazia a supervisão e, com o aval da direção, assinava os relatórios para, futuramente, eles ingressarem no PPE também”, lembra. Em 2019, participando do PPE através da FESF, atuou na Diretoria de Modernização Administrativa (DMA), setor da Secretaria Estadual da Saúde (SESAB) responsável pela área de tecnologia da informação e comunicação. Depois mudou-se para a Coinfra, órgão responsável pela conectividade e infraestrutura da SESAB.

Com o contrato finalizando, Levi teve uma oportunidade de ouro. A que precisava para se firmar. Um antigo técnico da fundação foi pedir uma ajuda ao DMA e o pessoal estava com muita demanda. “Me dispus a ajudar. Deu problema nos servidores da FESF e tinha parado tudo. Consegui remontar todos os servidores e recuperar os dados”, destaca. “O pessoal viu o resultado do trabalho e migrei direto para trabalhar na fundação”, comemora. Em novembro do ano passado Levi começou a dar suporte remoto à rede da FESF e, agora, atua na Diretoria de Ciência, Tecnologia e Informação – DCTI. Levi é a primeira pessoa da família da mãe a ingressar em uma universidade federal. Aos 21 anos, cursa Ciência e Tecnologia na Universidade Federal da Bahia (UFBA). O menino da Vila Rui Barbosa (antigo Jardim Cruzeiro), na Cidade Baixa, segue decidido apostando nos estudos como meio de crescimento pessoal. “Tem uma frase que minha mãe sempre fala: vá, tente, tem um jeito”, destaca.

Transformação

Além de Iasmim e Levi, podemos contar a história vitoriosa de muitos outros trabalhadores educandos do PPE que seguiram trabalhando nas Unidades de Saúde e na FESF-SUS, mesmo após o Projeto Primeiro Emprego. Todos acompanhados de experiências riquíssimas, com muita aprendizagem, contribuições com o serviço público, aperfeiçoamento de habilidades e competências, e claro, muitas histórias de superação e vitórias.

Para o diretor geral da FESF, Ricardo Mendonça, esta parceria da instituição com o Projeto Primeiro Emprego tem proporcionado aos profissionais técnicos ganhar experiência, o constante estímulo para que eles contribuam para transformar a gestão pública. Ele também destaca a importância da boa relação construída com os demais servidores públicos nas unidades de atendimento na área de saúde, que fazem da iniciativa governamental uma referência de política pública voltada para a garantia de direitos e fortalecimento da educação profissional como um dos pilares na vida de jovens baianos.