Por Walmir Rosário
A crescente preocupação com o meio ambiente vem aproximando os povos que tenham algo em comum. O que lhes unem não é o sangue, mas o que dispõem como a cultura ou meios de sobrevivência. De repente, o morador de Rio Pardo de Minas descobre que tem algo em comum com os canavieirenses, apesar dos quase 600 quilômetros de distância.
E têm: aí os moradores da nascente do rio Pardo, na Serra das Almas, em Rio Pardo de Minas (MG) e deságua em Canavieiras, após percorrer 565 quilômetros e encontrar o Oceano Atlântico. São 220 km em território mineiro e outros 345 em terras baianas. Se chove muito lá no norte de Minas essa água terá que desaguar na ilha da Atalaia, em Canavieiras.
E nesse caminho percorrido, às vezes muitos estragos são causados. Derruba casas, árvores, carrega animais, dá fim a lavouras. Certo que o mineiro não tem culpa, mesmo assim toma todas as providências para que retome a altivez de antes, quando o Pardo tinha água em abundância: pra dar e vender, como dizem. E os resultados positivos saltam aos olhos de qualquer vivente.
Aqui pra bandas da Bahia o povo ribeirinho do Rio Pardo ainda não abriu os olhos ou, melhor dizendo, não conseguiu convencer os governantes sobre o assoreamento do leito do rio, o fim da navegação, o sumiço dos peixes. Mesmo assim, o Pardo ainda é o maior habitat do robalo, pescado por caravanas do Espírito Santo, Rio de Janeiro, Goiás, e até São Paulo. Levam toneladas.
E o Rio Pardo sempre teve uma responsabilidade muito grande com seus ribeirinhos, essencialmente no Sul da Bahia, onde banha imensos cacauais. Aliás, às margens do Rio Pardo foram plantados os primeiros cacaueiros por Antônio Dias Ribeiro, com as sementes trazidas do Pará por Luiz Frederico Warneau, isso em 1746.
Que o cacau foi e ainda é uma potência econômica da Bahia (e hoje do Brasil), todos sabem, mas poucos conhecem a importância do Rio Pardo na cacauicultura, fornecendo água e fertilizando com suas enchentes. Muitos ainda sabem esse cacau era transportado por canoas até os armazéns de Canavieiras, lembra que somente a canoa Baleia tinha capacidade de levar 200 sacas de 60 quilos (12 toneladas), além da tripulação.
Se a população de Rio Pardo de Minas se preocupa com o Rio Pardo, muitos sulbaianos têm se manifestado ao longo de anos. Nessa conta cabem o Grupo Apaixonados por Canavieiras, Tyrone Perrucho, Miguel Fróes, dentre outros. Uma dessas ações foi a Circunavegação Tyrone Perrucho, percorrendo o Rio Pardo, dando a volta às sete ilhas canavieirenses.
E foi a tenacidade de Miguel Fróes em realizar viagens em trechos do Rio Pardo, feitos em canoas e caiaques, explorando aspectos geográficos e culturais que “desaguou” nesse encontro dos povos do Rio Pardo. Na primeira tentativa, em que os canavieirenses iriam a Rio Pardo de Minas a pandemia não permitiu; feito conseguido agora com os mineiros explorando as margens do Rio Pardo por quase 600 quilômetros, montados em bicicletas.
E como o canavieirense é um grande anfitrião, Miguel Fróes moveu céus e terra para recebê-los em festa, com direito a encontro cultural e musical no Porto Grande (ou velho), justamente às margens do Rio Pardo. E os mineiros mostraram sua música de viola com Waldir Perninha; a cidade e a proteção ambiental com Felicíssimo Tiago, e o Tenente Kennedy.
E Canavieiras apresentou sua fanfarra do Colégio Luiz Estadual Eduardo Magalhães (Fanec), a Lyra do Commercio, o Grupo de Percussão Ouro Negro e a Banda Mulheres do Samba. Foi uma sexta-feira (21-02) digna das festas realizadas no Porto Grande (centro histórico de Canavieiras). Neste sábado, a comitiva visitou a chegada das águas do Rio Pardo no Delta de Canavieiras e seu encontro com o Oceano Atlântico.
Em Canavieiras o Rio Pardo tomou gosto pela terra e se espalhou como quis, e continuou seu percurso em forma de V, criando dois leitos, nos quais se acomodou garbosamente. No da direita continuou sendo chamado de Pardo pelos ribeirinhos; no caminho tomado pela esquerda foi batizado como Cipó. Não contente, ao chegar perto da cidade tomou o nome de Patipe.
Ao vislumbrarem a Ilha da Atalaia, voltara a tomar forma única e, unidos num delta, embocam na boca da barra para se juntar às águas do Oceano Atlântico. E Miguel Fróes não descansa e promete uma nova Circunavegação Tyrone Perrucho, agora ostentando o número 2, com a presença dos mineiros do Rio Pardo de Minas.
Walmir Rosário é radialista, jornalista e advogado