Por Walmir Rosário
Parece que foi ontem! Esta é a impressão que o engenheiro agrônomo Luiz Ferreira da Silva deixa transparecer no livro “A Fazenda Corumbá que virou Ciências (Cepec), 60 anos atrás”. Em janeiro de 1963, ainda com o diploma cheirando a tinta, ele aporta em Itabuna para iniciar sua vida profissional no ainda embrionário Centro de Pesquisas do Cacau (Cepec), mais ou menos convicto das dificuldades que o esperavam.
Assim que recebeu o diploma na Escola Nacional de Agronomia da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) passou a analisar três propostas de trabalho: da Acar-ES, da Sudene, em Pernambuco, e do Ministério da Agricultura no Sul da Bahia, em convênio com a Ceplac. Duas dessas bastante conhecidas e conceituadas, e ainda por cima, já estava com a passagem aérea enviada pela Sudene para iniciá-lo no emprego.
Mas, por ironia do destino, Luiz Ferreira se influencia com uma explanação do engenheiro agrônomo Frederico Afonso sobre o início da operação da Ceplac na cacauicultura, inclusive com o levantamento dos solos da região cacaueira. Bom aluno de matéria Pedologia, ainda teria o seu professor Marcelo Camargo, como orientador. Soube de todas as dificuldades que passaria numa região inóspita, mas resolveu topar a parada.
E assim, em 22 de janeiro de 1963, Luiz Ferreira desce do Dart Herald da Sadia no aeroporto de Ilhéus para correr os quatro cantos das terras do cacau. Nesta época, o Cepec, que se transformou no maior centro de pesquisas de cacau do mundo, sequer existia. Pelo que ele conta, o ditado “tirar leite de pedra” era verdade e a ciência começava a ser feita numa casa sede da Fazenda Corumbá.
Sob a coordenação de Paulo Alvim, entomologistas, fitopatologistas, fisiologistas, dentre outros especialistas se juntaram à equipe de pedologia, entre eles os geólogos Paulo Ganem Souto e Pedro Barbosa de Deus. E os novos cientistas vasculharam toda a região cacaueira fazendo o levantamento de solos, sejam nos jipes pretos da Ceplac, no lombo de burros, a pé e até por avião, com o levantamento aerofotogramétrico.
Enquanto o corpo técnico desbravava fazendas de cacau, a Ceplac construía a sede do Cepec, adquiria equipamentos de ponta para a pesquisa, contratava novos profissionais de áreas afins. A proposta era solucionar, vez por todas, os problemas da cacauicultura baiana, custe o que custar, analisando dentro e fora das porteiras. Apenas o crédito não bastava, era preciso ter boas plantas e repassar as técnicas aos produtores.
E o Cepec se tornou a maior sede da ciência por metro quadrado, com engenheiros agrônomos, biólogos, geólogos, economistas, sociólogos, profissionais de laboratórios e técnicos agrícolas que se teve notícia. A repercussão foi bastante positiva também nas áreas urbanas, com o imenso volume de conhecimento espalhado por toda uma região, sem falarmos na forte injeção de recursos vindos para os projetos, insumos e salários.
Os que aqui chegaram fincaram raízes, formaram famílias, numa nova e mais ampla miscigenação da região cacaueira da Bahia. Transformou a economia para melhor e a cacauicultura foi esse carro-chefe por longos anos. Novos cacaueiros, adubações de solo eficientes, defensivos agrícolas mais qualificados, ampliação da produção e a produtividade do cacau. Saímos do gravame à fartura dos dólares no preço do cacau.
A frase dita pelo presidente Ernesto Geisel numa visita à região e à Ceplac: “Feliz do Brasil se tivesse 20 ou 30 Ceplac” ecoou por muito tempo e encheu de orgulho não só os ceplaqueanos, mas todo a nação grapiúna e sul baiana. No livro, Luiz Ferreira mostra com dados a produção de resultados altamente satisfatórios, com recursos aplicados na infraestrutura regional. Ganhamos estradas, energia elétrica, água tratada, telefone, porto, universidade. Traduzindo: a nação grapiúna ganhou dignidade.
Aposentado há alguns anos, Luiz Ferreira, que foi diretor do Cepec e da Ceplac Amazônia, continua publicando artigos e livros sobre a cacauicultura, sempre com sugestões da ampliação e melhoramento da cacauicultura, uma atividade altamente rentável e de proteção à Mata Atlântica. Aos 86 anos, esse alagoano que resolveu enfrentar as dificuldades em prol da cacauicultura continua impregnado pelo visgo do cacau.
O livro “A Fazenda Corumbá que virou Ciências (Cepec), 60 anos atrás” tem a apresentação de outro pioneiro da Ceplac, Lício de Almeida Fontes e suporte fotográfico e de informações do técnico agrícola José Rezende Mendonça, também dos tempos da Fazenda Corumbá. A Scortcci Editora produziu o livro. É um bonito passeio pela história da Cacauicultura, inclusive a queda da Ceplac. Vale a pena dedicar algumas horas de leitura.
* Walmir Rosário é radialista, jornalista e advogado