Osias Lopes
Quem está na faixa dos cinqüenta anos de idade conhece bem o assunto que irei tratar aqui. Lembramos bem dos tempos de nossos avós, e de nossos pais. Nós, ainda crianças ou adolescentes ouvíamos falar muito do “fio de bigode”, no sentido de que compromisso assumido, era compromisso que deveria ser honrado!
Numa dessas descompromissadas leituras que todos nós fazemos diariamente, me deparei com uma crônica onde seu autor narrava a história de seu pai com um contrato de locação do imóvel onde residiam.
O autor conta que é filho de uma família pobre, que vivia em casa de aluguel. Seu pai, um sujeito honesto, tinha a maior preocupação em não atrasar no pagamento do aluguel. Podia faltar tudo em casa, dizia ele, menos o dinheiro do aluguel. Essa preocupação do seu pai era constante, e assim foram anos e anos. Pelo menos uma noite (quando não duas ou três) por mês, ficava sem dormir! E doía-lhe mais a cabeça na época da renovação do contrato. Tinha que honrar fielmente o compromisso!
Um dia, ele, o autor, descobriu que não havia contrato algum de aluguel. Não havia aquilo que se costuma chamar de papel passado com as devidas assinaturas das partes. Havia sim uma palavra empenhada. Uma palavra de ambos os envolvidos – inquilino e senhorio. E seguiam aquilo. Era a tal questão de honra. O tal do compromisso honrado. E o seu pai nem dormia para honrar esse seu compromisso.
Eram os tempos dos fios de bigode. Pois homem que era homem, usava bigode. E para usá-lo tinha que honrar essa condição de homem. Tinha que ser muito macho, cumpridor de seus compromissos, custasse o que custasse, independentemente de crise econômica ou de enchentes, tinha que ter na cara, além do bigode, vergonha! Pois bem, um fio de bigode valia mais do que qualquer contrato escrito. Palavra dada deve ser entendida como palavra de honra, palavra de cavalheiro.
A expressão “fio de bigode” surgiu assim há muito tempo e consistia em garantir a palavra com um fio do próprio bigode. E, convenhamos, um dos bens mais valiosos que o ser humano pode ter, até os presentes dias, é a sua palavra. Um grande exemplo brasileiro dessa convicção foi o Visconde de Mauá, que se tornou o homem mais rico do Brasil de sua época. Vítima de perseguição política pelo Império (foi contra a guerra do Paraguai, era liberal e abolicionista), faliu. Ao invés de passar o calote nos credores, vendeu todos os seus bens, pagou a todos, limpou seu nome e recomeçou, com a cabeça erguida.
Tudo isso é interessante quando nós assistimos à disputa eleitoral, especialmente neste segundo turno das eleições presidenciais. Serra, quando candidato a Prefeito do Município de São Paulo, deu sua palavra, assinou um documento e registrou em Cartório, dando conta de que não seria candidato a nada enquanto durasse seu mandato de Prefeito. Renunciou-o na metade e se candidatou a Governador, dando a palavra mais uma vez de que também não renunciaria ao respectivo mandato, para logo após também a ele renunciar. Largou tudo e agora é candidato a Presidente.
Serra deixa transparecer que não aguenta ver um cargo pela frente que quer logo ocupá-lo, CQC! – custe o que custar! E a palavra dada? Ora, a palavra dada que vá às favas. Levar vantagem sempre, parece ser a sua “profissão de fé”. Tudo bem que faltem cabelos na cabeça de Serra, é a genética. Tudo bem que ele não use bigode, modernamente é opção. Mas lhe faltar dignidade de honrar com a palavra, de cumprir com os compromissos solene e publicamente assumidos é algo terrivelmente abominável! E compromisso registrado em Cartório então…!!!
Não se pode dizer agora que ele saiu candidato em razão das vicissitudes da vida política. Ora, um homem que vive apregoando em sua campanha de que é portador de uma “invejável” experiência política e administrativa, de vida pública, sabia ele, então, de antemão, que não honraria com sua palavra. Se assim o é, mentiu e mente solenemente para todos, despudoradamente, e em público!
Parece que de Serra nada se aproveita, uma vez que de nada vale sua palavra, de nada vale sua assinatura, enfim, de nada valem os compromissos morais que assume publicamente. E o que restará de valor nesse candidato profissional, então? De tanto faltar com a palavra dada, Serra deixa ficar a demonstração clara, explícita, de que não aprendeu de seus pais educação doméstica que os mesmos certamente lhe despenderam!
Para dizer o mínimo, Serra é, como diria minha avó, um “mal-ouvido”! Faltando tudo isso a Serra, ipso facto, lhe falta também nobreza, caráter, seriedade e honradez para assumir um cargo da envergadura e da relevância de Presidente do Brasil.
Convicto desses seus nefastos atos e ações, Serra comete o despautério de afirmar que está vendo e sentindo nascer um novo Brasil. Será esse o novo Brasil que Serra diz estar sentindo nascer nas ruas? Será que ele considera que os brasileiros estão se transformando, todos, tal como ele, em sem-palavra? Vade retro!
Osias Ernesto Lopes é advogado