Decidir se o parto será fotografado, o método para alívio da dor e a posição adotada na hora do nascimento. Essas são algumas das escolhas que as gestantes do município de Itabuna poderão fazer para garantir melhor assistência e uma experiência satisfatória no momento do parto. A introdução do plano de parto nas unidades básicas de saúde do município (UBS) foi instituída por meio da atuação do Grupo de Trabalho Direitos Sexuais e Reprodutivos, formado pelas defensoras públicas Luanna Lira Ramalho, Cristiane Barreto Nogueira e Juliana Florindo Carvalho, que idealizou a iniciativa.
“Esse é um instrumento de combate à violência obstétrica, pois garante à mulher acesso à informação sobre seus direitos e possibilita que ela se compreenda como dona do seu corpo, com autonomia para fazer suas escolhas. Além disso, traz certa horizontalidade para a relação com o sistema de saúde, já que, geralmente, no momento do parto, ela é muito verticalizada. As mulheres sofrem muita violência, inclusive a culpabilização das suas escolhas”, explica a defensora pública Luanna Lira Ramalho, que também é coordenadora da 4ª Regional da Defensoria Pública em Itabuna.
Os relatos de violência obstétrica por parte de mulheres e coletivos em defesa dos direitos sexuais e reprodutivos têm feito parte de atuação de Luanna na Defensoria desde 2020, quando passou a integrar a DP de Defesa da Mulher em Itabuna. Esse cenário motivou uma atuação junto às maternidades, com a realização de visitas, inspeções e até mesmo a participação em seminários de treinamento para enfermeiras e técnicas em enfermagem. Foi no decorrer deste trabalho que ela percebeu a existência de um fluxo de assistência às gestantes que envolvia também Ilhéus e iniciou uma articulação com a defensora pública Cristiane Barreto Nogueira, que atua na reparação de mulheres vítimas de violência obstétrica no município.
“O município de Ilhéus não possui UTI neonatal, por isso os partos de alto risco são encaminhados para Itabuna. Essa realidade motivou a constituição do GT de Direitos Sexuais e Reprodutivos para atuação nas duas cidades”, explica Cristiane Barreto. “Tratam-se de dois municípios vizinhos que possuem uma realidade muito similar no que diz respeito à violência obstétrica”, completa Luana. Em março de 2021, por meio da Portaria Nº 312, foi instituído o Grupo de Trabalho que tem como público-alvo mulheres em situação de vulnerabilidade no âmbito da prevenção da violência obstétrica.
O caso de Juliete (nome fictício) ilustra a situação vivenciada por mulheres nos municípios de Ilhéus e Itabuna e justifica a atuação do GT. Com 32 semanas de gravidez, ela começou a perder líquido e teve seu internamento negado na maternidade de Ilhéus com a justificativa de que a instituição não tinha estrutura adequada para atendê-la. Na ocasião, o profissional a aconselhou a buscar atendimento em Itabuna sem informar que tinha passado pela instituição ilheense. Entre outras violências sofridas, ela foi submetida a exames de toques desnecessários, foi pressionada a realizar uma cesariana de urgência com o argumento de que o falecimento do bebê poderia ocorrer em virtude de sua recusa, e teve aplicada uma anestesia geral para realização do parto sem seu consentimento.
A introdução do plano de parto na rede básica de saúde de Itabuna é fruto da articulação do GT com os coletivos de mulheres que trabalham na assistência ao parto, em diálogo com o sistema de saúde pública. De acordo com a coordenadora de Saúde da Mulher do Departamento de Atenção Básica de Itabuna, Katiane Reis Andrade, o documento será construído pela gestante, com o auxílio dos profissionais de saúde que realizam seu acompanhamento no pré-natal, a partir da 28º semana de gestação.
Segundo ela, atualmente, o município possui mais de 800 gestantes e a realização do plano de parto deve garantir maior segurança, especialmente para aquelas que vão dar a luz pela primeira vez. “O plano de parto vai trazer mais segurança, pois no momento da sua construção, elas poderão esclarecer dúvidas. Muitas delas são primigestas, nunca pariram, não sabem como nada acontece. Isso gera insegurança e medo. A partir do momento em que elas são orientadas e têm suas dúvidas esclarecidas, elas se sentem mais seguras e isso qualifica a assistência”, afirma.
Contudo, ainda não há data para que a política seja implementada. “Nós estamos em processo de elaboração dos folders informativos, onde também serão construídos os planos de partos. Esse material ainda precisará ser impresso para só então ser distribuído nas unidades de saúde. Como isso ainda envolve um processo burocrático, eu não consigo precisar quando iniciaremos a construção dos planos de parto com as gestantes”, justificou Katiane.
A expansão da política do plano de parto
Enquanto as gestantes de Itabuna não são apresentadas à possibilidade de construir o próprio plano de parto, a Defensoria já atua para garantir expansão da política para toda a microrregião que integra o município. No próximo dia 16 de agosto, o GT participa de uma reunião com a Comissão de Intergestores Regional (CIR) para tentar garantir que a política seja implementada em mais 21 cidades. “É importante que consigamos ampliar a inserção do plano para os municípios da microrregião, porque as gestantes das cidades vizinhas dão à luz na maternidade de Itabuna”, explicou a defensora pública.
A implantação do plano de parto em Ilhéus ainda será fruto de discussão. Contudo, a atuação do GT no município já promoveu reuniões com a Coordenação de Atenção à Mulher, da Secretaria Municipal de Ilhéus, e com a base da rede Cegonha, do Núcleo Regional de Saúde Sul (SESAB) para apresentação dos objetivos do GT, no mapeamento da rede de assistência às gestantes e para contribuição a partir da educação em direitos. O grupo também já participou das rodas virtuais de gestantes, promovidas pelos CRAS (Centro de Referência da Assistência Social), realizando abordagens de educação em direitos para prevenção da violência obstétrica.