Por Walmir Rosário

Lourival de Jesus Ferreira era um técnico em eletricidade e eletrônica que montou as três emissoras de rádio AM de Itabuna – Clube, Difusora e Jornal, nas décadas de 1950 e 60. Também foi redator, apresentador de programas e diretor de emissoras, um faz tudo conceituado e suas criações e produções eram respeitadas. Todas campeãs de audiência.

Apesar de pessoa de bom trato, educado, Lourival era muito exigente e cobrava qualidade dos colegas que dirigia. Na Rádio Difusora Sul da Bahia, do empresário e deputado estadual Paulo Nunes, tinha o aval dos filhos do parlamentar, sobretudo Paulo Nunes Filho e Hercílio Nunes, este o administrador da emissora.

Lourival Ferreira era o “homem de sete instrumentos” e suas recomendações deveriam ser cumpridas à risca, sob pena de um olhar mais duro, reclamação, suspensão e até demissão. Com o passar do tempo, Lourival estudou direito, advogou em Itabuna, prestou concurso para a magistratura, foi juiz em Una, Itabuna, Salvador e chegou ao cargo de desembargador.

Assim que foi trabalhar no setor esportivo na Rádio Difusora, o “olhar clínico” de Lourival Ferreira identificou outras qualidades no narrador Orlando Cardoso, como apresentador de programas e noticiarista. De início, passou a trabalhar em parceria com Romilton (Teles dos) Santos, já “cascudo” no microfone e que encarnava o personagem “Martelo”, no programa Martelo e Martelinho (Eurípedes).

Como Orlando Cardoso já tinha ganhado a confiança, numa de suas muitas viagens, Lourival Ferreira indica Orlando para substituí-lo na apresentação da Resenha Esportiva que ia ao ar das 18h45min às 19 horas. Na produção o sisudo Raimundo Galvão, e na apresentação Romilton Santos e Orlando. Antes da viagem, as recomendações de praxe: “Era um programa em que as brincadeiras não eram toleradas, daí a escolha”.

E a Resenha Esportiva continuou no padrão de antes, até que um dia, ao noticiar sobre o novo material esportivo do Itabuna amador (ainda o amarelo e preto), Orlando abre o microfone e diz: O Itabuna acabou de receber o seu novo material esportivo, vindo de Santa Catarina. E Romilton complementa: O material do Itabuna consta de maiôs, camisas e chuteiras.

Diante da falha de Romilton, que trocou a palavra meiões por maiôs, Orlando Cardoso não se contém, cai na gargalhada e não consegue se recompor. Aí Romilton empurra Orlando da cadeira e toma a frente, tentando consertar: Aliás, quer dizer, meiões, camisas e chuteiras. Em seguida pede um comercial e lembra o que Lourival Ferreira teria recomendado: “Nada de brincadeiras”. Recompostos, os dois disseram que imaginaram os pesados atletas do Itabuna com as genitálias dentro de um maiô.

De volta a Itabuna, Lourival Ferreira soube por ouvintes a falha humorística e pegou o rolo da fita do programa para ouvir a gravação. Para não deixar de graça, deu um esporro em cada um depois caíram na gargalhada. Tapinhas nas costas de Romilton e Orlando, o que seria a recomendação de continuarem, porém sempre observando os textos com atenção.

Outro grande locutor e apresentador da Rádio Difusora foi Germano da Silva. Crooner do Lord Ritmos (se não me engano o nome) e que culminou no Lordão anos depois, Germano foi locutor comercial e apresentador de programas e shows de auditório e praças. Dono de um vozeirão impecável, o locutor gostava sempre de falar palavras difíceis e com sotaque carioca.

Numa manhã, enquanto Germano faz a locução de um texto comercial, ressalta a palavra gratuito por “gratuíto”, em alto e bom som, caprichando na separação do ditongo “ui”, pronunciando “gra-tu-í-to”. E isso justamente quando Lourival Ferreira ia chegando à sala da técnica de som. Pela cara que fez, deu a impressão que tinham estourados os tímpanos do diretor.

Imediatamente, chamou Germano da Silva em sua sala e impôs como castigo ao apresentador Germano da Silva a compra imediata de um caderno de 100 folhas e que escrevesse a frase “a palavra correta é gratuita”, por três mil vezes. Germano tentava se explicar, mas não sabia como consertar. E Lourival Ferreira foi categórico: “Só me volte aqui quando tiver escrito tudo e aprendido a pronúncia correta”.

E assim foi feito. Como era uma sexta-feira, deixou a sede da emissora, passou numa papelaria, adquiriu o caderno recomendado, e passou o fim de semana escrevendo. Na segunda-feira se apresentou, mostrou a escrita e pronunciou a frase por diversas vez, por exigência do diretor. Foi reconduzido ao programa e continuou o showman no microfone.

Germano da Silva passou a atuar também na política, foi assessor de imprensa da Prefeitura de Itabuna por vários anos e apresentador de shows. Cursou Direito e passou a advogar em toda a região, atuando em várias áreas da advocacia. Germano Lopes da Silva é Patrono da Cadeira nº 11 da Academia de Letras Jurídicas do Sul da Bahia.

Walmir Rosário é radialista, jornalista e advogado