Por Walmir Rosário
Eu nem acreditei no que vi! E olha que estava avisado que o sumido velho Gurgel do saudoso jornalista desocupado Tyrone Perrucho estaria de volta. Naturalmente que fui convidado para a apresentação do tinhoso veículo pelos seus novos e felizes proprietários Eliomar Tesbita e sua esposa Dione. E na efeméride, muita cerveja e churrasco, próprios para receber os convidados na tarde de domingo (23-10).
Assim que chegamos próximo ao porto da rua da Prata, em Canavieiras, à sombra das frondosas amendoeiras e outras árvores, lá estava o velho Gurgel todo repaginado, vistoso nas novas cores, vermelho e preto. De cara, questionei Eliomar Tesbita, artista plástico de conceito internacional, o motivo de tão tresloucado gesto: E me responde que soube ter sido em vida Tyrone Perrucho um flamenguista enrustido, agora, assumido, além do mais que sua esposa Dione também é torcedora do time da Gávea.
E não foi mole chegar ao ponto em que chegou, todo nos trinques. Muita pajelança foi feita para deixá-lo, digamos, seminovo. De cara, uma decepção, o mestre Wilson, mecânico responsável pela penúltima pajelança do jipinho, não aceitou o convite de Tesbita – sabe-se lá qual o motivo – para ser o responsável pela empreitada em deixar o Gurgel como era há 30 bons anos.
E aí Eliomar Tesbita iniciou um planejamento administrativo – como fazia nos seus velhos tempos de Banespa – apropriado ao jipinho, iniciando como seria a pintura, contando com Luciano, para riscar as cores na cabine, pintada por Régis. Para cuidar da lataria, ou melhor, fibra de vidro, Jarbas foi escolhido a dedo. Na eletricidade, o mestre Dino partiu do zero e refez todos os chicotes e demais fiações.
Já as fechaduras e elevadores de vidros esteve a cargo do conceituado João Neto, e a tapeçaria ficou por conta de José Carlos e a mecânica foi entregue a Luiz Feitosa. Com essa plêiade de oficiais da funilaria, mecânica e pintura, tapeçaria, seria apenas dar início ao processo de restauração e partir para o abraço. Mas, ainda foram onde começaram a aparecer os problemas.
As conceituadas casas de peças das redondezas não mais se ocupam em oferecer os equipamentos e apetrechos para o velho Gurgel, o que rendeu mais trabalho diferenciado, sob os auspícios da internet. Uma simples pecinha responsável pelo movimento do limpador de para-brisa não existia no mercado e teve que ser feita numa fundição, criando, antes um molde nas mesmas dimensões da anterior.
Porém, o que mesmo preocupou o nosso artista plástico foi o veredito passado pelo mecânico de quatro costados, Luiz Feitosa, após revisar e recuperar toda a parte mecânica, incluindo, aí, motor, câmbio e suspensão. É que pelo olhar clínico de Eliomar Tesbita, acostumado aos traços e formas de suas telas, o velho, agora novo Gurgel, lhe parecia tombado para um lado. Por preocupante, para o lado esquerdo.
Após um novo exame do ressuscitado bólide urbano e rural, Luiz Feitosa reconheceu que não tinha os recursos necessários para deixá-lo aprumado como Tesbita queria, sem pender pra qualquer lado. E foi taxativo. “O problema é estrutural, terá que mexer no chassi, um trabalho difícil e especializado, nada fácil.” E o jeito foi deixá-lo do jeito que se encontra, como se ainda carregasse o peso do velho Tyrone ao volante.
Uma coisa é certa, daqui pra frente os profissionais que se ocuparam de colocar o velho Gurgel nos prumos saíram da empreitada com mais conhecimento do que antes. Se não de mecânica automotiva, de internet e até de fundição. Com celular à mão, qualquer um deles discute sobre telemática, logística, como no prazo de entregas e finanças, a exemplo das condições de pagamento e autenticidade das lojas.
Assim que a notícia sobre a reforma vazou, Raimundo Ribeiro, de lá do Belém do Pará, se assanhou em passar uma vistoria nas fotos, por conhecer o jipinho nas suas andanças em Canavieiras durante as visitas a Tyrone. Sem mais delongas, disse no Whatsapp: “Eu e a Sandra, minha coligada, pegamos muitas caronas no famoso Gurgel, cheio de histórias e estripulias”, exigiu com a reconhecida autoridade.
E não era de ontem que Eliomar Tesbita cobiçava o jipinho, estacionado desde a morte de Tyrone, verdadeiramente triste e acabrunhado com o sumiço repentino do seu inseparável companheiro. Após umas três rodadas de negociações do casal Eliomar e Dione com Edmo, batem o martelo e o jipinho passa para os novos proprietários. Antes, do padre Alfredo Niedermaier, Wallace Perrucho, Tyrone Perrucho e Edmo.
E o famosíssimo Gurgel, conhecido por estacionar próximos aos bares e congêneres, voltará a circular com desenvoltura por Canavieiras e, quem sabe, assim que o Detran mudar a cor nos documentos, fará uma breve viagem ao Pelourinho, em Salvador, no conceituado ateliê do artista plástico Eliomar Tesbita. Do jeito que se encontra, com certeza viajará lépido, sem qualquer perigo de amuar num bar qualquer das rodovias.
E o generoso gesto de Eliomar mostra no que é capaz um homem apaixonado, ao dar um presente tão simbólico à mulher amada. A lenda está de volta!
Walmir Rosário é radialista, jornalista e advogado