Por Walmir Rosário
Costumo dizer que tempo é coisa séria e o ser humano deveria ter mais cuidado, carinho, dedicação e precaução. Do contrário, ele passa e perdemos nós grandes oportunidades. Se não nos ligarmos no tempo estaremos inertes, amorfos, longe do mundo que nos cerca. É preciso que saibamos planejá-lo, administrá-lo, vivê-lo, aproveitá-lo, do contrário não recuperaremos o tempo perdido.
Na semana passada experimentei os efeitos do descaso com o tempo. O telefone toca, do outro lado o professor Durval Pereira da França Filho reclama minha presença para uns dois dedos de prosa, oportunidade perdida há tempos, que nem sei precisar quanto. E olha que nossa distância abissal é separada apenas por um muro, uma parede, se bem que as portas de entrada estão localizadas em ruas diferentes, paralelas.
Era hora de repararmos o sumiço e sentarmos para um bate-papo, lembrança dos amigos, do andamento da literatura produzida ao nosso redor. E por falar nisso, ambos publicamos recentemente livros novos. Bom nos vermos e contar as novidades. Dou a volta na rua e vou visitar o amigo Durval, conhecer o seu novo livro, “Temas e Tempos Diversos” recém-saído da impressora, um privilégio estar à frente nessa honrosa fila.
No novo livro, 17 trabalhos sobre temas diversos, publicados no extinto jornal Tabu e em outros veículos – alguns de circulação nacional –, versando sobre assuntos dos mais diversos. Como bem diz o texto de apresentação, “Trata-se de uma temática variada produzia ao longo do tempo, momento em que a mente do escritor estava a refletir os mais diferentes temas”.
E os textos estão longe do academicismo e numa linguagem agradável – longe do rebuscamento –, convida gentilmente o leitor a continuar atento às páginas seguintes e se deliciar com as histórias contadas. O professor Durval trata temas históricos internacionais, políticos, religiosos, esportivos, sociológicos, ficcionais e da vivência, sempre com a leveza da boa língua portuguesa, sem sobrar nem faltar.
Em “Temas e Tempos Diversos”, Durval conta passagens de sua vida em “Em Nenhum Homem é uma Ilha”; em Tyrone Perrucho – Múltiplo e Singular, analisa a figura icônica do seu grande amigo. Já o texto “Humanus em prosa e verso”, tece comentários ao livro escrito por Antônio Pereira e Cláudio Zumaeta, uma construção poético filosófica, que lhe chamou a atenção. Este é um texto inédito.
No terceiro capítulo, a ficção “A Revolta dos Caranguejos”, chama a atenção para o texto em que o autor denuncia a destruição do meio ambiente, notadamente nos extensos manguezais de Canavieiras, modificando os costumes de sua população. Neste texto, Durval constrói um “poema” em prosa, numa linguagem ferina (mordaz) sem ser densa ou espalhafatosa, e conta a caminhada do poeta em suas divagações, noite adentro de Canavieiras. Quando o texto termina ficamos com o gostinho de quero mais.
O canavieirense Durval Pereira da França Filho é um intelectual de invejável currículo: professor do Colégio Estadual Osmário Batista, do Colégio Presbiteriano João Calvino, da Faculdade Santo Agostinho, em Ipiaú, cursinhos, secretário de Cultura de Canavieiras, diretor da Biblioteca Municipal Afrânio Peixoto, por 50 anos colaborador do jornal Tabu, escritor de vários livros publicados.
Graduado em História pela Universidade Estadual de Santa Cruz (Uesc), é pós-graduado em História Regional; Mestre em Cultura e Turismo pela Uesc, em parceria com a Universidade Federal da Bahia (Ufba). Na dissertação do mestrado apresentou o trabalho Belmonte, Memória, Cultura e Turismo: numa (re)visão de Iararana de Sosígenes Costa. É, também funcionário aposentado do Banco do Brasil.
Assumi o compromisso de declinar qual o texto que mais me chamou a atenção. Li todos com atenção, alguns deles conhecidos, mas como não poderia de deixar de ser não poderia expressar minha admiração por “A Revolta dos Caranguejos”, na qual o autor expressa toda a sua verve de poeta, mesmo quando nos apresenta um trabalho em prosa, na qual a rima, a métrica e o ritmo estão nas palavras que descreve, em forma de texto.
E o professor Durval Pereira da França Filho surpreende seus leitores a cada obra publicada, embora todos saibam e conheçam sua intelectualidade e o esmero com que trata seus textos. Poeta desde a juventude, renega esse estilo e qualidade, tomando atitudes como não apenas amassar uma poesia cometida, mas rasgá-la, exterminá-la, deixando atônitos os leitores.
Mas, enfim, essa é uma licença que poeta se autoconcede, transferindo o lirismo e a linguagem figurada para a prosa, como em “Temas e Tempos Diversos”.
Walmir Rosário é radialista, jornalista e advogado