Por Walmir Rosário
No início do mês de maio, sem qualquer planejamento anterior, resolvi propor à minha mulher sumirmos por uns dias, semanas, como fazemos algumas vezes, há décadas, sem qualquer tipo de aviso prévio. Como de costume, compartilhamos a informação a poucas pessoas, pois já somos formados na vida e sem membros da família a exigir nossa constante presença.
Bastou comprarmos as passagens, arrumarmos as sacolas e viajarmos rumo a Paraty, com o objetivo de matar saudades de quatro décadas sem participar da Festa do Divino Espírito Santo. Um festejo de mais de 300 anos, cuja tradição é mantida com os rigores devidos da religião católica e da cultura daquela comunidade, que busca preservar o estilo de vida há centenas de anos.
Às vésperas da abertura da festa estávamos lá reencontrando os amigos, muitos feitos há mais de 50 anos e nos preparando para acompanhar as bandeiras, assistirmos às missas, enfim, todos os festejos inerentes à novena, e mais um domingo de celebração de Pentecostes. Tudo como dantes, porém organizado e ampliado com os requintes disponíveis aos atuais organizadores.
Não foi uma novidade pra nós, que sempre acompanhamos as festas do Divino Espírito Santo e de Nossa Senhora dos Remédios, a padroeira de Paraty, pelo canal da Pastoral de Comunicação (Pascom) no Youtube. Mas não tem como resistir às emoções vividas (ao vivo e em cores) nas cerimônias religiosas, da organização e das apresentações alegóricas.
Às 18 horas da sexta-feira (10), início da novena, um grande número de fiéis (inclusive nós) aguardava a abertura da Igreja de Nossa Senhora dos Remédios para garantir assento, devido à grande concorrência. Enquanto assistíamos a oração do terço, nos deslumbrávamos com riquíssima decoração, concebida pela comissão de festeiros, que se desdobram a cada ano em inovações.
A cada dia participam ativamente da celebração da missa padres de outras paróquias do Rio de Janeiro e São Paulo, o Bispo Diocesano, e as diversas comunidades católicas dos bairros e distritos. Enquanto os fiéis eram enlevados espiritualmente ao sublime pela evolução das cerimônias e a emoção pelas músicas sacras executadas pelas equipes de liturgia e animação, corações se abriam no apoio aos necessitados.
A cada dia o ofertório – em forma de alimentos – era destinado a um grupo ou comunidade e entregue na igreja para a distribuição nas comunidades carentes. No domingo (19), toda a coleta da missa de Pentecostes foi destinada aos desabrigados do estado do Rio Grande do Sul e alcançou a quantia de R$ 20 mil, um ato de grande generosidade.
Em Paraty, a Festa do Divino Espírito Santo não tem a conotação turística, mesmo que atraia visitantes. É considerada uma festividade religiosa, na qual a população católica se doa na sua realização, mantendo a tradição, como os leilões, a distribuição de carnes aos necessitados, os folguedos em volta da igreja, e a apresentação de músicas e danças do Marrapaiá e Bando Precatório.
No sábado (18), a festa do Divino Espírito Santo inicia o seu clímax com a Bênção do Almoço de confraternização do Espírito Santo, cuja fila dobra quarteirões. Na missa da noite – bastante concorrida – é realizada a cerimônia de Coroação do Menino Imperador do Divino, que no dia seguinte, acompanhado dos vassalos e guardas, vai à cadeia libertar um dos presos.
Seguramente, assim que a Festa do Divino Espírito Santo é encerrada, os festeiros escolhidos para o próximo ano montam as coordenações e começam a trabalhar para a festa seguinte. Além do Pároco Padre Luiz e do Vigário Padre Milton, mais de uma centena de pessoas se desdobram para realizar os festejos em devoção ao Espírito Santo, com o mesmo denodo dos que passaram.
Mas não pensem os leitores que Paraty se devota apenas ao Espírito Santo. Em setembro próximo uma nova novena será realizada em louvor à Padroeira Nossa Senhora dos Remédios. Pensam que basta? Estão enganados, pois ainda são realizadas as festas de Santa Rita de Cássia, São Benedito, e dezenas de outras nas igrejas e capelas por todo o município.
Mas se você ainda pretende acompanhar uma brilhante e piedosa procissão, recomendo que vá a Paraty durante a Semana Santa e participe da Via Sacra, a Procissão do Encontro, o canto da Verônica, dentre outros ofícios. Todos esses eventos realizados nas ruas da cidade, calçadas com pedras brutas e irregulares, aumentando o sacrifício. Então, quem sabe, poderão ajudar a aliviar os nossos pecados.
Walmir Rosário é radialista, jornalista e advogado.